23/01/10



o recluso (palavra mais feia) tende a ver tudo como uma prisão (palavra mais linda). eu tenho que fazer menos parêntesis (não é fácil). vou tentar (não prometo nada). o recluso tende a ver como uma prisão. a casa, o quarto, as ruas, as lojas, o carro, a cama. se a metáfora da prisão existe em todos os lugares, a derradeira prisão é aquela que o corpo encerra. se darwin nos fez ver que vivemos numa prisão global chamada natureza, weismann explicou-nos que a prisão é individual (o ouriquense explica). somos a mais inexpugnável das prisões. mendigamos inutilmente migalhas de liberdade aqui e ali, e nunca no sítio certo. o segredo é viver bem na prisão. mas numa prisão não se vive, subvive-se. procuro uma morte digna, but there's no such thing (por que é que escrevi em inglês?). a morte é feia, brutal, asquerosa e, ainda pior, extremamente aborrecida. não há boas maneiras de morrer; já experimentei quase todas. a vida não é mais do que um eufemismo para morte lenta. o meu corpo jaz há anos, mas insiste em respirar.

[neil young, see the sky about to rain.]

doing time